O Museu do Oriente convida a descobrir "Tesouros na Palma da Mão – O Coleccionismo de Frascos de Rapé", numa exposição dedicada à história destes requintados objectos. Para ver, 240 peças dos séculos XVIII e XIX revelam as curiosidades do uso e fabrico dos frascos de rapé, bem como as suas múltiplas formas, cores e decorações, fruto da mestria dos artesãos chineses da dinastia Qing. Fabricados na China a partir do final do século XVII, os frascos de rapé foram concebidos para conter tabaco moído ou para cheirar – o rapé – e facilitar o seu consumo. Eram atribuídas ao rapé inúmeras propriedades medicinais, como alívio das mais variadas queixas, da dor de cabeça às cólicas ou dores de dentes. Em sociedade, era de boa educação oferecer-se a “pitada” (dose) de rapé.
Durante os séculos XVIII e XIX, estes recipientes eram omnipresentes na sociedade chinesa, não apenas como objectos utilitários, mas também como símbolos de requinte e estatuto. Fabricados em diversos materiais, incluindo minerais esculpidos, cerâmica, vidro soprado (pintado ou não no interior), marfim trabalhado ou laca, os frascos de rapé eram verdadeiras obras de arte que reflectiam os gostos, a iconografia, os mitos e as lendas chinesas.
Esta enorme diversidade material e estética revela-se nas 240 peças expostas em “Tesouros na Palma da Mão”, pertencentes ao acervo da Fundação Oriente e do Museu Nacional Machado de Castro (Coimbra), em depósito no Museu do Oriente. Estas peças formam a "Colecção Manuel Teixeira Gomes", representando o gosto e a tendência pelo coleccionismo de objectos de arte que floresceram durante o século XIX.A exposição está dividida em sete núcleos, que compreendem os diferentes materiais e modos de fabrico dos frascos de rapé, a sua utilização, história e evolução.
Das plantações de tabaco brasileiras à corte imperial chinesa, passando pelos portos europeus, a história do rapé e dos seus frascos acompanha as rotas do comércio transatlântico, o desenvolvimento das artes decorativas na China e o fascínio que exerceram sobre os coleccionadores europeus, ao longo de vários séculos.
Manuel Teixeira Gomes (1860-1941), natural de Portimão, empresário, diplomata e 7º presidente da Primeira República Portuguesa (1923-1925), foi um ilustre coleccionador de objectos de arte chineses e japoneses. Entre 1911 e 1924, adquiriu frascos de rapé em leilões em Paris e Londres, oriundos de colecções europeias constituídas na segunda metade do século XIX.Teixeira Gomes doou ao Museu Nacional Machado de Castro, em Coimbra, uma impressionante coleção de 644 frascos de rapé, considerada uma das maiores da Europa.
O tabaco foi introduzido pelos portugueses, em meados do século XVI, em território chinês, a partir do entreposto comercial de Macau. Era de tal modo apreciado e caro, que o seu comércio no oriente era monopólio do Rei de Portugal.Embora o rapé também tenha sido produzido em vários países europeus e internamente na China, em Fujian e Cantão, o melhor rapé seria o chamado Amostrinha português, feito em Lisboa com folhas de tabaco brasileiro.Na altura, o Imperador chinês coleccionava e presenteava os seus favoritos e altos dignatários estrangeiros com frascos de rapé, tornando-os assim objectos de prestígio e símbolo de estatuto social. É dos reinados de Kangxi (1622-1722), Yongzheng (1723-1735) e Qianlong (1736-1796) que datam os mais belos frascos de rapé em vidro, mineral, metal e vidro esmaltado. Nesta época as oficinas imperiais estão no auge da sua produção, graças à elevada exigência do Imperador, grande protector das artes.O hábito de cheirar rapé. É no século XVIII que se difunde o hábito de cheirar rapé por toda a população, entrando em declínio nos finais do século XIX. No entanto, a procura de frascos de rapé por parte de coleccionadores ocidentais não acompanhou esse declínio, sendo nessa época que se constituem as maiores coleções na Europa e na América do Norte.
Seguindo o hábito de acondicionar medicamentos em frascos de vidro com tampa, para conservar as suas propriedades curativas, os primeiros frascos de rapé terão sido produzidos em vidro, material favorito dos imperadores Qing. Seguiu-se a porcelana e tantos outros materiais como a tartaruga, calcedónia, marfim, madrepérola, jade, ágata, quartzo, esmalte pintado, âmbar, cinábrio, laca, coral, prata e muitos mais.Os frascos de rapé foram sendo enriquecidos pelos artífices chineses para deslumbrar os utilizadores mais exigentes: à simplicidade das superfícies coloridas ou transparentes, foram acrescentando texturas e detalhes, como pinturas minuciosas, representações esculpidas, moldadas ou embutidas, de figuras humanas, plantas e animais, cenas lendárias ou históricas e símbolos de bom auspício.
Cada frasco de rapé possuía no seu interior uma pequena e estreita colher em marfim ou metal, para a colocação da “pitada” de rapé, a dose ideal, que poderia ser inalada a partir do interior da unha, sobre o dorso da mão ou entre o polegar e o indicador? Por volta de 1800, cheirar rapé fazia parte do modo de vida chinês? Durante os 100 anos seguintes, os frascos de rapé tornaram-se num objecto familiar em qualquer casa chinesa.Era sinal de educação, quando se encontrava um amigo na rua, pegar no frasco de rapé e oferecer uma pitada de tabaco?
As peças da Doação Manuel Teixeira Gomes, pertencentes ao acervo do Museu Nacional Machado de Castro, encontram-se em depósito no Museu do Oriente, ao abrigo do protocolo de cooperação celebrado em 2002 entre a Fundação Oriente e o (extinto) Instituto Português de Museus.